Apresentação

A justiça a que recorro é a consciência democrática
de nosso povo e dos povos de todo o mundo.
Honestino Monteiro Guimarães
(Mandado de Segurança Popular, 1973)

No dia 10 de outubro de 2013 completaram-se 40 anos do desaparecimento de Honestino Monteiro Guimarães. Perseguido, sequestrado, preso, torturado, morto e ocultado pelo Estado brasileiro, Honestino é um dos “desaparecidos políticos” da ditadura civil-militar no Brasil.

Ainda hoje, as últimas páginas de sua vida permanecem em branco. Sob quais circunstâncias desapareceu? Quem deu a ordem para sua execução? Quem presenciou sua morte? Quando e onde aconteceu? O que fizeram com o corpo?

Especialmente para seus familiares e para aquelas pessoas que querem conhecer melhor sua história, somam-se outras inúmeras perguntas: Como ele resistiu? Que palavras pronunciou? Como era sua voz? Existe algum vídeo dele? Algum registro fotográfico que não conhecemos?

Lamentavelmente, nenhuma dessas perguntas foram respondidas pela Comissão Nacional da Verdade (CNV). A expectativa era que fatos e arquivos relevantes fossem trazidos à tona, revelando as ansiadas respostas estabelecedoras da verdade. Contudo, o processo bastante conturbado e com limitada força de vontade política, deixou muito a desejar para todas e todos que lutam pelo direito à Memória, à Verdade e pela efetivação da Justiça de Transição no Brasil.

A luta por Verdade e por Justiça em relação às atrocidades cometidas pelo Estado brasileiro entre 1964 e 1985 revela cada vez mais sua necessidade. As violentas cenas de repressão às manifestações realizadas em todo o País em 2013 evidenciaram a importância de debates e reflexões sobre a democracia e sobre o papel do Estado na garantia dos direitos culturais e políticos, especialmente da liberdade de expressão e do direito à livre manifestação.

Bombas de efeito moral, balas de borracha, sprays de pimenta, espancamentos, agressões físicas e verbais, grampos telefônicos, espionagem digital, queda de páginas e redes sociais e até mesmo sequestros e desaparecimentos foram relatados por manifestantes e pelos meios de comunicação que cobriram os protestos. Infelizmente, esta é uma realidade comum para quem vive nas favelas e periferias, para quem luta pelo direito à terra e em defesa do meio ambiente, para povos tradicionais entre tantas outras pessoas. Para essas populações é como se a ditadura nunca tivesse acabado, o que se traduz de forma brutal no extermínio empreendido contra a juventude negra e nas opressões impostas contra as populações atingidas por hidrelétricas.

Neste cenário, onde tais práticas continuam sendo promovidas pelo Estado, seja por meio de suas forças policiais ou mesmo por sua omissão, o direito à Verdade, à Memória e à Justiça revela sua fundamental importância. A efetivação de uma Justiça de Transição no Brasil significa não somente avançar na construção da democracia no País, como também garantir as condições mínimas para a construção de uma nação verdadeiramente democrática e emancipada.

Na medida em que não dermos respostas às injustiças cometidas no passado e que não interrompermos o enraizamento de práticas e valores apregoados pela ditadura – a partir, por exemplo, da revisão dos livros e do ensino de história nas escolas e universidades, do fortalecimento da formação cidadã das novas gerações, ou ainda da abolição das doutrinas e políticas de segurança e de defesa que continuam calcadas na lógica do controle, da repressão e do abuso de poder – estaremos perpetuando e aprofundando as injustiças e inviabilizando a própria democracia. Tudo isso aliado à impunidade que ainda perdura gera efeitos espantosos e abomináveis, a exemplo dos pedidos de volta da ditadura bradados em tom de rancor por parcela conservadora e/ou alienada da sociedade.

Sem o conhecimento sobre o passado perdemos a capacidade de estabelecer conexões entre os desafios do presente e aqueles enfrentados pelas gerações que nos antecederam. Sem essa dimensão e correlação histórica, o significado de nossa própria existência corre o risco de se diluir. Tornamo-nos seres ignorantes do nosso potencial e da importância do nosso papel para a construção de um futuro diferente e melhor.

Promover o conhecimento e a reflexão sobre o passado para fortalecermos a luta pelo fim das atrocidades e injustiças no presente, com vistas à construção de uma sociedade verdadeiramente democrática, livre e emancipada, capaz de dar passos firmes rumo a um futuro de paz e justiça social: essa é a meta principal que buscamos ao promover e difundir a história e a memória de Honestino Monteiro Guimarães, sua geração e sua luta.

Pelo Direito à Memória, à Verdade e à Justiça!

Para que nunca se esqueça! Para que não mais aconteça!

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